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Contratações Inclusivas






Acompanhando o espírito da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, a Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015 - Lei Brasileira de Inclusão (LBI), trouxe significativo avanço normativo ao assegurar de forma mais clara o direito de as pessoas com deficiência serem incluídas na vida social nas mais diversas esferas, por meio de garantias básicas de acesso, a serem concretizadas por meio de políticas públicas (com ênfase nas áreas de educação, saúde, trabalho, infraestrutura urbana, cultura e esporte) e de iniciativas afetas à sociedade.
Com essa intenção, a LBI promoveu a alteração de diversos diplomas legais, entre eles a Lei nº 8.666, de 1993 a qual foi modificada em dois pontos.
Em artigo publicado no GenJurídico, Rafael Carvalho Rezende Oliveira, destaca a preocupação com as questões sociais e ambientais no âmbito das contratações públicas ao citar Maria João Estorninho: às finalidades tradicionais da contratação pública foram-se somando novas preocupações. Aos poucos, foi-se tomando consciência de que a contratação pública, a par dos seus objetivos imediatos, pode servir como instrumento de realização das mais variadas políticas públicas, nomeadamente ambientais e sociais. Ainda, Pedro Costa Gonçalves preconiza: o incentivo à inovação tecnológica, a promoção da sustentabilidade e as políticas sociais e ambientais são valores e objetivos de interesse público que o direito da contratação pública também deve proteger, no contesto deste princípio da prossecução do interesse público ou de interesses públicos, no plural.
Nesse aspecto, é que a LBI, ao modificar a Lei de Licitações atentou, além da necessidade de que as contratações públicas selecionem a melhor proposta e o atendimento das necessidades administrativas, para a inserção, no processo que direciona essa escolha, de relevantes objetivos de caráter social.
A primeira modificação é relativa ao desempate entre os licitantes, com a inclusão de tratamento favorável aos bens e serviços produzidos ou prestados por empresas que comprovem o cumprimento da reserva de cargos para pessoa com deficiência ou reabilitados da Previdência Social:
“Art. 3.º (…)
§ 2.º  Em igualdade de condições, como critério de desempate, será assegurada preferência, sucessivamente, aos bens e serviços:
I – (revogado).
II – produzidos no País;
III – produzidos ou prestados por empresas brasileiras.
IV – produzidos ou prestados por empresas que invistam em pesquisa e no desenvolvimento de tecnologia no País
V – produzidos ou prestados por empresas que comprovem cumprimento de reserva de cargos prevista em lei para pessoa com deficiência ou para reabilitado da Previdência Social e que atendam às regras de acessibilidade previstas na legislação.” (destaque nosso).
Os parâmetros acima identificados devem ser observados sucessivamente para o desempate entre os licitantes, sendo o estatuído no inciso V, o quarto critério de desempate. Todavia, a recente doutrina[1] acerca desse tema considera que o mesmo deveria ter prevalência sobre os demais, considerando-se sua forte vinculação ao princípio da dignidade da pessoa humana.
A segunda inovação respeita à alteração do § 5º do art. 3º da Lei 8.666, de 1993. Ali se inclui margem de preferência em favor dos bens e dos serviços produzidos ou prestados por empresas que comprovem o cumprimento da reserva de empregos para pessoa com deficiência ou reabilitado da Previdência Social e que atendam às regras de acessibilidade previstas na legislação.
“Art. 3.º (…)
(…)
§ 5.º Nos processos de licitação, poderá ser estabelecida margem de preferência para:
I – produtos manufaturados e para serviços nacionais que atendam a normas técnicas brasileiras; e
II – bens e serviços produzidos ou prestados por empresas que comprovem cumprimento de reserva de cargos prevista em lei para pessoa com deficiência ou para reabilitado da Previdência Social e que atendam às regras de acessibilidade previstas na legislação.” (destaquei).
Neste ponto, a lei permite a participação de toda e qualquer empresa interessada na licitação, mas sua nova redação consagra duas preferências distintas: uma, com o objetivo de garantir o desenvolvimento sustentável (I) e outra, garantindo a inclusão no mercado de trabalho das pessoas com deficiência ou reabilitados da Previdência Social (II).
A partir da ponderação desses interesses, relativiza-se a economicidade da contratação em prol do desenvolvimento nacional sustentável e da proteção da pessoa com deficiência.
Ambas as alterações advindas da LBI reforçam a tendência da utilização das contratações públicas como incentivo para a inclusão das pessoas com deficiência, embora a letra da lei, por si só, não seja capaz de fomentar essa inclusão no mercado de trabalho ou em qualquer outro cenário. Todavia, é um avanço, uma vez que induzirá a um comportamento diferente. As contratações começarão a se orientar também pelo pressuposto social e não tão-somente econômico.
Comportamentos geram hábitos e esses são capazes de modificar culturas. Assim, bem-vinda a inovação.


Valéria Cristina Gomes Ribeiro









[1] Rafael Carvalho Rezende Oliveira in http://genjuridico.com.br



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